quarta-feira, 27 de junho de 2018

AS MANIFESTAÇÕES DE UMBANDA EM VALENÇA-PI


                                                     ... TUDO, POR UMA QUESTÃO DE FÉ



Cada povo possui uma maneira diferente de entender as divindades religiosas, daí existir um pluralismo de manifestações que encadeiam o intuitivo de cada um. A cidade de Valença do Piauí,  teve sua origem de aldeia de índios aruaques, localizada na serra da missão na atual cidade de Aroazes-Piauí.
No início, este povo chamado primitivos. pelos primeiros colonizadores que por aqui passaram, tinham suas manifestações religiosas atreladas a natureza e o ciclo do conhecimento de época.
Com a chegada dos primeiros desbravadores, por volta do final da primeira metade do século XVII, trouxeram a religião cristã, através do catolicismo e foram conquistando espaço, pois além de desbravarem a região, o colonizador também repassava mensagem de fé.
Salvar almas era o grande objetivo cristão, mesmo na maioria das vezes os financiadores da fé estivessem mais distantes de Deus, que os próprios habitantes da terra ora conquistada.
Por volta de 1762, quando da instalação da vila de Valença-Pi, a 20 de setembro, existiam africanos vivendo como escravos,   e pessoas livres. Convém mencionar que estes africanos e/ou remanescentes, tinham e conservaram sua religião de origem, embora de forma clandestina. Neste caso as manifestações religiosas de matriz africanas já existiam  por estas plagas desde este período histórico, cujo repassar a seus descendentes, as rezas e rituais não era coisa fácil, pela repressão as práticas de culto e a forma exótica como eram trabalhadas.
Neste caso, é preciso entender, que, foi no silencio da noite, sob o zumbido das muriçocas e o estalar da lenha  da fogueira que os pretos e pretas velhas mantiveram sua tradição e conseguiram repassar suas crendices e rituais religiosos trazidos e adquiridos no decorrer do tempo por seus ancestrais.
O tempo passou, a cautela para tanto era necessária, e aos poucos foi ocorrendo o sincretismo cuja metamorfose ritualista na maioria das vezes bifurcava entre os que praticavam o bem e os que faziam o mal, cuja orientação pela sociedade branca e detentora do poder financeiro, era altamente seletista, levando em conta os traços físicos e faciais. Geralmente se o rezador, “cientista popular” ou mesmo o feiticeiro, era pessoa advinda de classe subalterna, possuidor de pouca escolaridade e comportamento estranho diante de certas situações sociais, culturais ou mesmo religiosas, cheio de superstições, crendices, agouros, cujo repertório de malefícios intimidava as pessoas que passavam a tê-lo como amigo. Os poucos que arriscavam. era mais por temor, que por considerações recíprocas.
Assim, foi se formando as religiões de matrizes africanas no território valenciano, nomes como Cinobelino Soares da Silva, Antonio Fernandes, Chico Feitosa, Manoel da Vaca e tantos outros, se firmaram e tornaram-se referências na prática do bem. Enquanto, João Luzia, morador na comunidade Ovelha Morta, localizada as margens da estrada rumo para o povoado João Pires, era visto como o catimbozeiro mais temido da região.
As  as pessoas se apavoravam quando se deparavam com ela nas ruas da cidade, ou mesmo nos trajetos que trafegavam pela estrada do João Pires, ao passar por sua residência, faziam o sinal da cruz, cruzavam os dedos, não olhavam para traz com receio de serem atingidas pelas práticas do mal, evocadas por ele.
No frontal de sua casa, existiam vários bonecos de barro sob um peitoril, isso provocava um medo terrível nas pessoas, segundo informações de moradores próximos, Dona Benedita, esposa de Cinobelino, quando vinha para Valença, montada em seu cavalo, trazia consigo uma cabaça com água pura da fonte para ser despejada em frente à casa de João Luzia, com o objetivo de quebrar as forças malignas se por acaso ele quisesse fazer o mal a ela e/ou a seu esposo Cinobelino.
Com o surgimento dos salões de Umbanda entre as décadas de 1950-1970, o som do tambor, tornou-se uma referência na cidade, uns pelo diferente, outros pela curiosidade, mas no Cômputo geral, chegava a atrair pessoas para frequentar e adeptos para desenvolver suas entidades.
Nas sextas-feiras, quando o tambor rufava, logo se formavam um grupo para ir ao terecô. Lá, uns iam para observar, outros para se escandalizar e muitos para falar mal. Outras pessoas temiam ir porque tinham medo de receber “entidade” e ter que desenvolver os “passes”.
Nos meados da década de 1970, na rua Cicero Portela, nas imediações do cruzamento com a PI 120 que vai para cidade de Pimenteiras-Pi, uma Senhora por nome Gorete, esposa de um Senhor por nome Paixão, ambos da classe popular, tornou-se o nome mais comentado na cidade, porque recebia o espírito de uma criança, diariamente no turno da tarde. Para lá convergia um número bastante acentuado de pessoas para ver o ocorrido, dentre os olheiros, muitos estudantes até mesmo do Ginásio Santo Antônio, compareciam para ver e conversar com a divindade sobrenatural. Tudo isso ocorria num momento quando os salões ainda não funcionavam e as mães e pais de santo, atendiam em suas residências altas horas da noite, primeiro pela clandestinidade, segundo porque o cliente não queria ser visto pela população.
Assim, foi sendo construindo a ideia da criação e manutenção dos salões de umbanda em Valença do Piauí, de forma lenta, mas gradual, até encontrarem pessoas que pudessem se firmarem como adeptos, embora de forma muito resumida, porque se sobrecarregavam de preconceito, pela forma  exótica como tudo ocorria. Atualmente ainda  é um numero muito pequeno de seguidores ou melhor que se apresentam de forma oficial, mas a clandestinidade, é bem aguçada. Os que assim se comportaqm, admitem que a Umbanda para eles tem sua importância. Este  número pequeno de seguidores na ativa é ocasionado, pela escassez de informações sobre o tema, daí,  clandestinamente o número ser bem maior e crescente,  pois quando se trata de sobrenatural as pessoas temem e acreditam no poder da transformação, na maioria das vezes vendo a Umbanda como um mal necessário para suas vidas.
                                       Antônio José Mambenga
                            Valença do Piauí, 15 de junho 2018.