EM VALENÇA DO PIAUÍ, O 1º DE MAIO É DIA DE
COLOCAR FLORES NAS PORTAS DAS CASAS
Prof. Esp. Antonio Jose Mambenga
A cidade de
Valença do Piauí, guarda na sua História muitas manifestações culturais, uma
delas é colocar flores nas portas e janelas no dia 1º de maio de cada ano. O
costume é bastante remoto, trazido pelos
primeiros habitantes no início da colonização desta região ainda no século
XVII.
A História
Oficial, aponta a presença do colonizador
por estas plagas por volta da
segunda metade do século XVII, quando da presença do Bandeirante Domingos Jorge
Velho e seus comandados, no vale do Rio Santa Catarina, atual Rio Catinguinha
ou suas imediações, onde foi fundado o Arraial dos Paulistas.
“O Arraial de Paulistas” foi o único centro urbano do Piauí
no século XVII, e sucumbiu ante a escassez de índios para
serem capturados como escravos, ... Nos escombros da po-
voação foi erguida a atual cidade de Valença do Piauí, no
centro-leste do estado .(SILVA: 2008 – p 36)
Este povo, vinha provido de hábitos e
costumes oriundos de seus ancestrais, dentre as quais a tradição de colocar
flores nas portas e janelas na noite de 30 de abril, para saudar o 1º de maio,
acredita-se ter iniciado neste período. Aqui os bandeirantes, passaram cerca de
16 anos e deram continuidade, repassando
aos habitantes do Arraial de Paulista,
os hábitos e costumes que absorveram com seus ancestrais na terra berço. O
tempo se encarregou de cristalizar na memória de cada um, como deveria ser
visto o dia 1º de maio de cada ano. Outros moradores foram chegando e se
adequando a realidade local, até construírem uma identidade própria mesmo tendo
que se adaptar a realidade de cada um,
seguindo o princípio que “o homem é produto do meio que vive”.
Segundo a tradição em parte do norte de Portugal,
na noite de
30 de abril para 1º de maio, muitas pessoas
colocam maias (gi-
estas floridas) nas portas das casas para
lembrarem o tempo
da fuga de Jesus para o Egito Noutras terras colocam maias
no ferrolho da porta para serem protegidos das doenças e dos
Espíritos maus.(MOTA: 2012)
Assim foi
passando de geração para geração esta tradição de origem europeia na atual cidade de Valença do Piauí. Embora sofrendo
adaptações conforme a época e limitação cultural de cada família. Todavia, é
comum observar a forma como são tratadas as flores que são colocadas nas
portas. Convem dizer que em Valença, as flores são colocadas nas portas e
janelas no amanhecer do dia 1º de maio, dependendo do despertar de cada um. Os
que acordam mais tarde, assim fazem mas ninguém, se arrisca colocar pós as 9
horas da manhã, primeiro pela temperatura ser alta oscilando entre 28° e 35°
Graus e comumente o 1º de maio raramente
amanhece chovendo.
Minha
mãe, Sra. Benedita Luzia(1922-2017), cultivava plantas, dentre elas um exemplar
de buganville vermelho, ofertado por sua madrinha Maria Juvina, quando ainda
morava na Rua Areolino de Abreu, e a medida que mudava de endereço, providenciava
uma muda para nova residência. Além da buganville, cultivava outros tipos de
flores, como margarida, bredo, jasmim, e bugarim, para que no dia 1º de maio, não lhe faltasse flores
para colocar nas portas e janelas da casa onde morava. Neste dia tudo era
motivo de festa. Acordava muito cedo,
colhia flores do pequeno jardim e complementava com flores silvestres colhidas
nos arredores da casa e circunvizinhança, e colocava nas portas e janelas
frontais, e na porta de entrada, fazia uma espécie de tapete. Com as demais, cumpria o mesmo ritual
enfeitando tambem a casa dos filhos que moram próximos. Quando acordávamos, era
bonito ver a singeleza das flores cultivadas e das flores campesinas
ornamentando nossas portas e janelas e melhor ainda era saber que eram
colocadas por nossa mãe. Às vezes “a maioria eram flores do campo, que deixavam
transparecer até nos mais distraídos a singeleza da vida bucólica”, ali
incrustada.
Em Valença, o
costume de colocar flores nas portas no dia 1º de maio, para o imaginário das
pessoas, funciona como uma saudação ao mês de Maria, Mãe de Jesus, que conforme
a tradição, neste dia, a Mãe de Nosso
Senhora Jesus Cristo, percorre toda cidade, abençoando as residências
ornamentadas com flores.
Maio recebeu o nome do deus Maius que era o deus da primavera
E do crescimento. Para outros vem de Maia, mãe
de Mercúrio. As
Celebrações em honra de Flora, a deusa das flores e da juventude
(mãe da Primavera). Iniciavam o novo ano agrícola e
atingiam, na
Roma antiga, o seu clímax nos três primeiros
dias de Maio. A Igreja
Católica declarou Maio como o mês de Maria, a
mãe e rainha.(MOTA:
2012).
No entardecer
do dia 1º de maio, bem na hora do crepúsculo, quando as atenções se voltam pra
o momento do Angellus, é comum as famílias valencianas que ornamentaram suas residências com flores, ascenderem uma
fogueira para iluminar a passagem de Nossa Senhora, que novamente faz o sentido
contrário da visitação matutina, em sinal de agradecimento.
O objetivo da
fogueira, é se por acaso, Nossa Senhora, durante a passagem matutina, tenha
passado na residência, e ainda não
estivesse ornamentada, a luminosidade da fogueira ao anoitecer, serve
como indicativo, que os moradores cumpriram com a tradição, mesmo fora do
horário. Quando da Passagem Nossa Senhora, abençoará a família e tudo fica resolvido. E
como tudo tem um tempo, a medida que a cidade foi
crescendo, a fogueira foi sendo substituída por iluminação elétrica, fincada em
postes de cimento.
É comum também as famílias colocarem uma
lâmpada na frente da casa, ou mesmo, acender uma vela de preferência de cera de
abelha silvestre e na ausência desta uma vela branca comum. Enquanto isso, nos
bairros mais distantes e na zona rural a tradição da fogueira ainda permanece
em voga.
Na década de 1940, quando a cidade se resumia
entre a ruas do Maranhão, rua do Fio, rua do Fogo, Largo da Bela Flor,
Cacimbas, Casa do Loreto e outras poucas casas na atual Rua Areolino de Abreu,
no dia 1º de maio, a cidade era acordada
pela cantoria do Ofício de Nossa Senhora, puxado por Dona Tereza Preta, moradora
num casebre onde atualmente é a Casa Renascer, Dona Felisbela, mãe do Antonio
de Mato, Dona Felícia, mãe do Pedro Mudo, ex-serviçal da Casa do Padre Aristeu,
que morava na Casa Grande da Tranqueira, Dona Antonia, Mãe de Siá Chica
Paraguai e tantas outras. Das Cacimbas,
participavam: Dona Josefa e Dona Matildes, irmãs de “seu” Lucas de Dona
Neguinha. E do Sítio Betel, eram
presenças garantidas, a mãe da Maria Pretinha, Chiquinha Furtuosa, Dona Maria Germana e a mãe do João Urubu.
Estas mulheres, faziam a diferença, saiam cantando em alta voz o Ofício de Nossa Senhora, rua
acima e rua abaixo, numa linguagem entre a língua oficial e um latim, conforme
aprenderam pela oralidade. Elas conduziam muitas flores, algumas cultivadas
e a maioria eram silvestres. O
ritual era exótico, mas em momento algum se tem notícia que foram clicadas pela
lentes do fotógrafo de época, Sr. Benedito Macaco, pai da Maria Macaquinha. O
certo é que além de passarem pela Igreja São Benedito, e Nossa Senhora do Ó,
onde deixavam parte das flores, tinham paradas nas casas de suas patroas,
locais que durante o ano exerciam
prestação de serviço, umas como cozinheiras, outras como lavadeiras de roupas, babás, ou mesmo como
operárias no período da colheita dos cajus. Dentre elas, existiam aquelas que
eram boleiras, e/ou outros serviços típicos de época como botadeiras de água do
Rio Catinguinha para o consumo doméstico. Muitas vezes paravam, na Casa da Dona Dina
Dantas, Dona Odila Martins, Dona Chiquinha de “Seu” Abdon, e de Dona Maricas do Sr. Clovis, aonde
aumentavam a voz para que Nossa Senhora ouvisse melhor suas vozes.
Examinadas o porque das paradas em
pontos estratégicos, Tereza Preta como era mais extrovertida, respondia: -- São
estas pessoas que nos socorrem no momento que mais precisamos durante o ano
todo e neste dia, somos gratas a Nossa Senhora e a elas pelos que fazem por
nós. Em cada uma destas casas elas deixavam flores que somavam com as já
existentes embelezando a cidade de Valença e mantendo viva a tradição do 1º de
maio.
O certo é que no 1º de maio, a cidade de Valença do Piauí, era contemplada com a
manifestação cultural das flores nas portas das residências, e a cantoria do
Ofício de Nossa Senhora, protagonizado
por estas senhoras simples e anônimas que tinham uma forma diferente de saudar
Nossa Senhora pelas benesses recebidas e
suas patroas pelo serviço que lhes davam durante o ano.
Assim, a
tradição era mantida e ainda continua na contemporaneidade, mesmo tendo ficado
apenas na memória a participação das senhoras cantoras, que eram vistas mais
pela forma exótica de manifestação de que mesmo como expressão de uma cultura
popular e laicista, mantida em nossa
cidade por muito tempo. Atualmente o 1º
de maio é lembrado mais pelas flores colocadas nas portas e janelas das casas enquanto
a memória se encarrega de atiçar as mentes atentas que garimpam os modos, hábitos e costumes de nosso povo num
determinado tempo histórico que ocorria no 1º de maio.
BIBLIOGRAFIA
CARITA, Lourdes, Tradição das Maias ... uma pratica
tradicional e intercultural Recordação cristã e pagã – 12/05/2012 – Blog:
http://abemda nação.blogs.sapo.pt
MAMBENGA, Antonio Jose, Em Valença-PI, Colocar Flores Nas Portas No Dia 1º de Maio é
Mito Ou Tradição?: www.tribunadevalenca.com - 01/05/2017
SILVA, Reginaldo Miranda da, Piauí de Paulista, Revista
História da Biblioteca Nacional, ano 03
– Nº 34 – Julho de 2008 – Rio de Janeiro - RJ
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